21/03/2009

Documento

Carta Aberta ao Presidente Lula e ao Ministro da Cultura Juca Ferreira
Ilustríssimos Senhores

Nos últimos seis anos do vosso governo constatamos que não houve nenhum avanço na criação e no desenvolvimento de políticas públicas, democráticas, transparentes e descentralizadas para as artes no país, apesar dos Programas de Cultura do Partido dos Trabalhadores, que apontavam para um novo modelo gestor, de entendimento da Questão Cultural e que serviram de base para as diferentes campanhas políticas até a eleição do atual governo. E isso frustra a categoria, dadas as expectativas geradas pela vossa eleição e o modelo exemplar que ele poderia representar para as políticas públicas estaduais e municipais por todo o país.



Pensávamos, há seis anos, que um momento mais fértil para a cultura e para o país havia chegado, pois o governo empossado, recebendo o mandato de milhões de trabalhadores para atender às reivindicações mais sentidas do povo brasileiro, iria lutar por instrumentos de inclusão e cidadania e entendia a cultura como um bem inalienável do cidadão, um direito de todos e de cada um, tão importante quanto a saúde, o transporte e a educação.

Pensávamos, há seis anos, que haveria uma possibilidade do Estado servir aos interesses da maioria do povo brasileiro em contraponto às idéias neoliberais de um estado mínimo e à base do programa do governo que vos antecedeu. Mas não foi o que aconteceu.

E por não avançar este governo retrocedeu!

Hoje, no ano de 2009, a crise escancara nossos portões e o vosso governo, com seus recursos acumulados em superávits fiscais, corre para socorrer os grandes grupos econômicos e, mais uma vez, deixa para a maioria da população o desemprego, a falta de assistência médica, uma educação insuficiente e uma cultura entregue à indústria do entretenimento. Uma indústria que nada mais visa além do lucro e que transforma a cultura e as artes em produtos sem valor além do consumo imediato, sem poesia e sem reflexão sobre o que somos como cidadãos e como sociedade. Ou seja, sem perspectiva de futuro para além das necessidades básicas de sobrevivência – trabalhar para sobreviver e fazer a máquina econômica girar.

Nós, trabalhadores do teatro e das artes, vos dirigimos esta carta para pedir o que parece impossível, mas esta é uma tarefa que nos cabe – pedir o impossível! Não nos incomodamos com isso, afinal nos diziam que era impossível um operário chegar à presidência da república. Entretanto do que adianta fazer acontecer o “impossível” para depois tudo continuar como antes?

Pedimos que o Estado Brasileiro, que vosso governo no tempo que ainda resta, se ocupe da coisa pública, e aja para o desenvolvimento e proteção de seus cidadãos. E que pense no futuro do nosso país para além de um grande mercado consumidor, um grande canavial, um grande pátio de estacionamento para as montadoras.

Por isso nós trabalhadores do teatro conclamamos o atual governo a dizer um basta à política de privilégios, à entrega do Estado à iniciativa privada, à perda dos direitos dos trabalhadores e ao fisiologismo político que trata as questões da soberania nacional como uma bolsa de valores sem nenhum outro horizonte a não ser luta pelo poder.

E através desta carta reivindicamos:
- O fim da lei de isenção fiscal para a cultura.

- A criação de um Fundo Público para a Cultura, através de Lei.

..........- Que ele seja o responsável pela implementação de políticas públicas para todas as áreas da cultura.

..........- Que ele opere através de editais públicos em todas as regiões do Brasil com a participação paritária, em suas comissões de seleção, de representantes escolhidos pelo governo e pelos participantes dos respectivos editais.

..........- Que este fundo tenha uma dotação orçamentária mínima anual definida pela lei, e que portanto esta lei seja encaminhado pelo poder executivo como um projeto de governo.

- A imediata implantação do projeto “Prêmio Teatro Brasileiro” sob a forma de um edital nacional ainda para o ano de 2009.

- O descongelamento dos 75% do orçamento da união para o Ministério da Cultura. E um aporte de verbas suplementar para que ele atinja o mínimo de 2% do orçamento geral da União.

Pela nossa experiência dos últimos anos constatamos e entendemos que qualquer lei para a cultura tem necessariamente que contar com uma dotação orçamentária própria (recursos garantidos pela lei), pois isso evita a manipulação política e o corte indiscriminado destes recursos decorrentes de negociações políticas escusas (o balcão de negócios em que a política tem se transformado) e da ignorância por parte dos políticos de plantão sobre a importância que a cultura e as artes têm no desenvolvimento da real cidadania.

Sr. Presidente e Sr. Ministro, a luta por políticas públicas para a cultura é a luta pela soberania nacional e pela construção de um país de cidadãos livres no pensar e no agir.

As reivindicações feitas neste documento são de interesse público e a “Lei de Fomento para o Teatro Brasileiro” é fruto do amadurecimento de muitos anos de estudos sobre o que é realmente uma política cultural de interesse público para o cidadão. Hoje nos colocamos em luta por isso, pois acreditamos que com nossa luta possamos conquistar o impossível.

Movimento 27 de Março

Um comentário:

Spartacus disse...

O prejuízo causado pela "indústria da alienação" ou, como preferem os conservadores apologistas da democracia cega, indústria do entretenimento é tão amplo quanto a população do Brasil. O nível de pessoa formado nas salas de vídeo de cada casa, barraco ou mansão, que assista diariamente ao bombardeio desesperado de palhaços ignorantes da tv aberta, ávidos por instigar qualquer instinto dos telespectadores, contanto que os faça ter a indisposição suficiente para não se dar ao trabalho de pensar, não seria capaz de responder a qualquer questão que escape de seu escopo sensacional de sons e imagens. A tv, na atual situação, de fato educa para a imbecilidade.
O problema mais incompreensível, porém, é perceber que uma instituição tão nociva à educação é completamente isenta de críticas e repressões . Basta alguém citar um ou outro excesso que comprometidos defensores da democracia liberal se levantam ofendidos com o ultraje.
Sejamos sinceros, o Estado é tão fraco quanto uma andorinha no verão. Mas não por falta de apoio. Uma gama imensa de cientistas sociais e da saúde mental concorda em refrear o ímpeto destruidor de mentes dos sistemas de comunicação de massa. O motivo se origina no temor a organizações capitalistas.
Dentro dessa realidade, propostas como a procura por elevação do senso estético e crítico da população brasileira, devem percorrer o universo das prioridades, se queremos viver num país de cidadãos.